O homem que plantava árvores, de Jean Giono


Ficha técnica
TítuloO homem que plantava árvores
Autor – Jean Giono
Editora – Marcador
Páginas – 70
Data de leitura – 22 de setembro de 2017

Opinião
Esta obra é uma pequenina preciosidade. Recorda-nos o quanto podemos fazer pelo mundo em que vivemos apenas com as nossas mãos e a nossa vontade.
Retrata a determinação de um só homem, de um homem que vive apenas na companhia do seu rebanho, do seu cão e da natureza que o envolve e que é a viva prova de que “os homens podem ser tão eficazes como Deus noutras áreas para além da destruição.” (pág. 34)
É um bálsamo que nos aquieta na dezena de minutos que tarda a sua leitura, mas que se mantém connosco muito e muito tempo depois.
É uma janelinha que nos ilumina e nos faz abraçar o otimismo.
Pessoalmente foi ainda um analgésico que preparou o caminho para a leitura cruíssima que se lhe seguiu.
Cumpriu assim todos os propósitos.

NOTA – 08/10

Sinopse

Jean Giono escreveu este conto lendário nos anos 50 do século XX, com a esperança de desencadear um programa de reflorestação a nível mundial que promovesse a regeneração do planeta. Uma mensagem muito à frente do seu tempo. Inspiremo-nos no incansável pastor que transforma montes hostis numa magnífica floresta.

A casa do sono, de Jonathan Coe


Ficha técnica
TítuloA casa do sono
Autor – Jonathan Coe
Editora – Edições ASA
Páginas – 320
Datas de leitura – de 15 a 22 de setembro de 2017

Opinião
Sempre fui dorminhoca, sempre tirei prazer em dormir, em enroscar-me debaixo dos lençóis, fechar os olhos e deixar-me ser invadida pelo sono. Em jovem reivindicava o direito indiscutível de dormir as minhas dez horinhas. Agora reconheço que a maternidade moldou esse direito, reduzindo-o a quantidade bem menores. Contudo, o prazer mantém-se, sobretudo naqueles dias gelados de inverno, em que nada há melhor do que rolar para o lado, aconchegar os cobertores e regressar ao mundo do silêncio, da quietude e dos sonhos.
Por ser tão dorminhoca, por apreciar tanto o sono e as suas características tão beneficamente saborosas, decidi, após ter lido algumas opiniões positivas sobre a obra A casa do sono, trazê-la da biblioteca e embalar na sua leitura.
Arranquei com a mesma numa noite como uma outra qualquer, em que sempre leio já deitada na cama, para melhor entrar no mundo dos sonhos. Anotei mentalmente a advertência do autor sobre o facto dos capítulos ímpares se reportarem aos anos de 1983-84 e os pares às duas últimas semanas de junho de 1996. Fui sendo apresentada às personagens principais e constatando que praticamente todas se debatiam com o sono e as suas variantes. Fui assimilando os sonhos, os projetos, as ambições de todos e verificando o quanto esses mesmos sonhos, projetos, ambições se concretizavam ou não. Fui absorvendo o estilo aparentemente simples do autor, por vezes irónico, sarcástico, humorístico, por vezes realista, amargo, sofrido. Fui ganhando empatia por Sarah, por Robert. Fui ganhando uma clara antipatia por Gregory. Fui aprendendo as fases do sono e que dão nome às partes que dividem a obra. E fui sendo surpreendida com as reviravoltas e torcidas da narrativa.
Mesmo nos dias em que o “João-Pestana” (ou “Sandman”) ameaçava fechar-me as cortinas e enviar-me para a Fase Um de um retemperador soninho, teimei em ler mais uma página, mais um capítulo, porque todas as peças se iam encaixando de uma forma quase perfeita e o sabor que ia retirando da leitura da caixa que emoldurava as vidas de quatro ou cinco pessoas banais, relacionadas por vivências do passado, era cada vez mais apelativo, culminando num desenlace surpreendente e muito satisfatório.
Foi assim uma leitura deveras interessante, com um toque de humor britânico e que me leva a querer conhecer mais do que já escreveu Jonathan Coe, um autor com muitos traços de brilhantismo.
Uma obra que recomendo, com personagens muito peculiares, como podem comprovar pela sinopse, mas que merecem que as conheçamos!

NOTA – 08/10

Sinopse
Um enorme edifício no alto de uma falésia, o barulho das vagas, um labirinto de corredores vazios onde o ruído dos passos ecoa… A propriedade de Ashdown abrigou nos anos oitenta uma residência de estudantes: aí encontramos Sarah, que sofre de narcolepsia e não consegue distinguir os sonhos da realidade; o seu namorado, Gregory, que só atinge o orgasmo ao pressionar com os dedos os olhos de Sarah; Terry, um pretensioso crítico de cinema que dorme pelo menos catorze horas por dia e nunca consegue recordar o que sonhou; e Robert, capaz de amar sem limites. Quatro personagens simultaneamente trágicas e hilariantes, capazes de tecer entre si relações extremas que, contudo, não os impedirão de se afastarem.
Doze anos depois, a residência é transformada numa casa de saúde especializada em perturbações do sono. Estranhamente, os ocupantes do edifício voltam a ser os mesmos. Mas nem sempre se lembram dos laços complicados que em tempos ligaram as suas vidas...
Movendo-se entre o passado e o presente, A Casa do Sono é um romance desconcertante, uma estranha e dilacerante história de amor sobre a realidade e o sonho, a memória e a identidade.

Para onde vão os guarda-chuvas, de Afonso Cruz


Ficha técnica
TítuloPara onde vão os guarda-chuvas
Autor – Afonso Cruz
Editora – Alfaguara
Páginas – 622
Datas de leitura – de 05 a 15 de setembro de 2017

Opinião
Há muito que ouvia dizer que Para onde vão os guarda-chuvas é a melhor obra de Afonso Cruz ou pelo menos uma das melhores. Talvez seja. Porém, não encontro nela nada que a destaque das outras que já li – Os livros que devoraram meu pai e Flores. Isto não significa que não me tenha agradado. Não, agradou-me muito, mas, no meu entender, não é uma obra “mais-prima” do que as suas congéneres.
Em Para onde vão os guarda-chuvas tropecei de novo em passagens deliciosamente perfeitas, em paralelismos muito assertivos entre a vida e um tabuleiro de xadrez, em fotografias esclarecedoras e num conjunto de personagens que só poderiam sair da mente lúcida e mágica de Afonso Cruz. Contudo e paradoxalmente, aquilo que mais me emocionou, que mais me tocou foi ao mesmo tempo aquilo que me fez questionar o número de páginas da obra, aquilo que não permite que lhe atribua uma nota mais elevada. Falo da personagem de Isa.
Isa é o âmago, a essência da obra, mas é superficialmente mencionado nas páginas iniciais e só regressa à narrativa quase cem capítulos depois. Compreendo que esse “interregno” tem como propósito explicar o porquê de um muçulmano ter adotado uma criança cristã, mas Isa é demasiado especial para estar tanto tempo sumido da narrativa. Compreendo se afirmarem que a obra vai muito mais além do que as suas personagens, que aflora muitos temas cruciais à nossa existência, mas os dias em que passei na companhia de Isa iluminaram-se com uma luz muito própria, com uma vontade louca de sentá-lo no meu colo e dar-lhe um abraço interminável, com um aperto no peito que ainda hoje me acompanha, com gritos e soluços mudos, com um sorriso coberto de lágrimas por testemunhar o fim de uma luta – ter conseguido aquilo que tanto, mas tanto desejava – ser o menino da sua “mãe viva”.
Custa-me assim perceber por que uma obra com mais de seiscentas páginas não tenha mais de Isa. Como pode um autor criar uma personagem tão bela, tão carente, tão generosa, tão sofrida, tão cativante e não lhe dar mais protagonismo? E como pode um autor criar um Isa, dar-nos a possibilidade de conhecê-lo, de amá-lo e não antever que nos sintamos frustrados por apenas estar ao seu lado durante um terço da obra?...
Uma coisa é certa – nunca me esquecerei de Isa. E isso devo-o à magistralidade de Afonso Cruz. Posso estar descontente com o facto de ter esperado perto de cem capítulos para conhecê-lo, mas esse descontentamento é suavizado por tudo o resto, por tudo o que faz de Isa uma personagem única, inesquecível. Por isso, obrigada, Afonso Cruz.
Tenho noção de que esta opinião é algo redutora, que haveria muito ainda para dizer ou comentar sobre Para onde vão os guarda-chuvas. Mas não me peçam mais, porque não me é possível satisfazer-vos. Colmato a falha partilhando algumas passagens plenas de sabor e de genialidade:

Para onde vão os guarda-chuvas? São como as luvas, são como uma das peúgas que formam um par. Desaparecem e ninguém sabe para onde. Nunca ninguém encontra guarda-chuvas, mas toda a gente os perde. Para onde vão as nossas memórias, a nossa infância, os nossos guarda-chuvas?” 

“(…) como um pensamento está dentro do cérebro, como o verbo sentar está dentro das cadeiras.” (pág. 49)

“ – Um homem e uma mulher (…) são um puzzle de duas peças que só se resolve com o amor”. (pág. 68)

“ – Posso continuar cristão?
(…)
“ – Podes, desde que sejas um bom muçulmano.” (pág. 379)

NOTA – 08/10

Sinopse
O pano de fundo deste romance é um Oriente efabulado, baseado no que pensamos que foi o seu passado e acreditamos ser o seu presente, com tudo o que esse Oriente tem de mágico, de diferente e de perverso. Conta a história de um homem que ambiciona ser invisível, de uma criança que gostaria de voar como um avião, de uma mulher que quer casar com um homem de olhos azuis, de um poeta profundamente mudo, de um general russo que é uma espécie de galo de luta, de uma mulher cujos cabelos fogem de uma gaiola, de um indiano apaixonado e de um rapaz que tem o universo inteiro dentro da boca.
Um magnífico romance que abre com uma história ilustrada para crianças que já não acreditam no Pai Natal e se desdobra numa sublime tapeçaria de vidas, tecida com os fios e as cores das coisas que encontramos, perdemos e esperamos reencontrar.

Ulisses, de Maria Alberta Menéres


Ficha técnica
TítuloUlisses
Autora – Maria Alberta Menéres
Editora – Edições ASA
Páginas – 68
Datas de leitura – de 12 a 16 de setembro de 2017

Opinião
Esta foi a terceira leitura que o D. trouxe para férias e foi a que tanto ele como eu menos gostamos. Ulisses e as suas façanhas não nos conquistaram…
Reconheço que a versão infanto-juvenil deste clássico da literatura mundial está muito bem conseguido, Maria Alberta Menéres aproximou-o à faixa etária dos miúdos da idade do meu, usando uma linguagem muito acessível e resumindo em pouco mais de cinquenta páginas as múltiplas aventuras do protagonista de Odisseia, de Homero. Contudo, ou seja porque narra uma realidade muito distante da que o meu filho vive ou porque essa realidade convive muito de perto com um mundo efabulado ou ainda porque a Antiguidade Clássica nunca me atraiu, sentimos que o que lemos não é apelativo, não nos diz nada e muito dificilmente será recordado por razões que não aquelas que estão associadas à obrigatoriedade da sua leitura para a disciplina de Português.
Sendo assim, apesar de admirar o trabalho importantíssimo que Maria Alberta Menéres tem levado a cabo em prol da literatura, não sou capaz de recomendar esta leitura. É muito provável que haja leitores que se entusiasmem e se maravilhem com as proezas de Ulisses, mas infelizmente nem eu nem o meu pequenote fazemos parte deles…
Venha a próxima leitura!

NOTA – 05/10


Sinopse
Plano Nacional de Leitura
Livro recomendado para o 6º ano de escolaridade, destinado a leitura orientada.
Foi Homero, poeta grego, quem contou no seu livro Odisseia as façanhas de Ulisses, rei de Ítaca, adorado por todos os que o conheciam.
Muitas e estranhas foram as viagens que fez à volta do mundo de então e de si próprio. A sua fama correu de boca em boca e todos o consideravam como o mais manhoso dos mortais e o mais valente marinheiro.
Grande parte da sua vida, passou Ulisses navegando de aventura em aventura, por entre Ciclopes e Sereias encantatórias ou tentando libertar-se da misteriosa Feiticeira Circe para regressar à sua fiel Penélope. Diz-se que, nesses tempos de antigamente, não houve homem que mais sofresse e mais feliz fosse do que o espantoso Ulisses

As histórias que não se contam, de Susana Piedade


Ficha técnica
TítuloAs histórias que não se contam
Autora – Susana Piedade
Editora – Oficina do Livro
Páginas – 342
Datas de leitura – de 30 de agosto a 03 de setembro de 2017

Opinião
Três mulheres. Três experiências traumáticas. Três dores imensuráveis e incomparáveis. Ana perde o noivo que morre inesperadamente, vítima de um AVC. Um atropelamento mortal rouba a luz da vida de Isabel, deixando-a amputada, deixando-a órfã do seu filho. Marta volta a ser vítima de violência doméstica. Depois de ter sido agredida física e verbalmente pela sua mãe, enquanto adulta volta a ser violentada, desta vez pelo seu namorado. Três histórias que nos atarantam, que nos desorientam e paradoxalmente nos centram porque nos põe ante experiências que nos podem tocar a todos.
Comprei esta obra após ter lido a opinião correspondente que a Márcia publicou no seu “Planeta”. Uma obra que ela recomendava muito. Uma obra recheada da dor que procuro de forma quase doentia. Uma obra finalista do prémio Leya. Uma obra com uma escrita aprimorada, que conduz o leitor ao lado mais íntimo, mais nu de cada uma das protagonistas e que vai abrindo brechas nesse novelo de dor que as compõe. Uma obra que, tal como a Márcia, recomendo muito.
Não é difícil compadecer-nos da Ana, da Isabel ou da Marta. Senti o coração apertado ao longo de toda a leitura, mas talvez porque sou mãe, senti-o ainda mais apertado com a dor e a perda de Isabel. A perda de um filho é algo que não consigo imaginar, só a perspetiva de, só o pensar em me deixa completamente transtornada e, por isso, amparei a dor dela, o seu sofrimento, a sua loucura, não questionei as suas atitudes. Li, absorvi ao mesmo tempo que repelia o que absorvia e chorei. Chorei muito. Com as outras protagonistas não criei uma ligação tão umbilical, porém não deixei de sofrer por ambas, de, por um lado, me alegrar com os pequenos passos que Ana vai dando para espantar a dor, para buscar consolo na amizade que se forma entre as três e, por outro, de abanar a cabeça de incredulidade sempre que Marta, uma jovem doce e genuinamente boa, se vergava e aceitava como merecida a violência que lhe caía em cima.
Esta obra foi a obra de estreia de Susana Piedade, mas desengane-se quem crê que nela irá encontrar indícios de inexperiência ou pouca maturidade. Pelo contrário. Para além do já referido estilo cuidado e aprimorado, a narrativa cativa ao leitor, leva-o a lê-la a um ritmo quase sôfrego, a querer entrar nas histórias destas três mulheres e a penetrar em dores, em fantasmas e em sofrimentos que não se partilham, que se escondem, que se enterram no cantinho mais recôndito talvez porque são dores, fantasmas e sofrimentos que se acha que mais ninguém vai entender ou que lados de uma vida que envergonham, que estigmatizam.
As histórias que compõem esta narrativa recomendam-se por tudo o que referi. Se tropeçarem nelas não deixem de as agarrar e de as conhecer. Não se arrependerão.

NOTA – 09/10


Sinopse

Ana pergunta-se como seria hoje o seu dia-a-dia se tivesse sabido detetar no namorado os indícios da doença que o levou inesperadamente. Isabel, seis meses depois da tragédia que lhe virou a vida do avesso, ainda se sente culpada por não ter chegado a horas ao infantário naquela tarde de chuva. Marta, que ousou abandonar, ainda adolescente, uma casa onde era maltratada, não tem agora a coragem de confessar que o amor em que apostou tudo está longe de ser um mar de rosas. São três mulheres jovens, com a vida inteira pela frente, mas para quem o presente se tornou um fardo difícil de carregar e o futuro um tempo sem qualquer esperança. Quem poderia entender a sua dor incomparável? Para quê, então, contarem as suas histórias?

Pedro Alecrim, de António Mota


Ficha técnica
TítuloPedro Alecrim
Autor – António Mota
Editora – Edições ASA
Páginas – 112
Datas de leitura – de 22 de agosto a 02 de setembro de 2017

Opinião
Pedro Alecrim trouxe-me recordações, trouxe-me histórias que fui ouvindo ao longo dos anos, de crianças que tiveram que crescer demasiado depressa, mas que, mesmo assim, não se libertaram de resquícios da inocência e pragmatismo que dão cor à infância.
Um menino que vive numa aldeia, longe da escola onde frequenta o sexto ano: um menino que não tem muito tempo para fazer os deveres ou para estudar porque, mal chega a casa, tem que pousar a mochila e ajudar os pais nas lidas do campo e no trato dos animais. Um menino que, mesmo assim, não é um mau aluno, mas que não consegue entender muito bem para que lhe servirá no futuro as matérias que aprende em aulas dadas por professores algo enfadonhos e distantes. Um menino que ama a terra e os animais (excetuando as toupeiras, ratos, ratazanas, cobras e outros que não fazem falta nenhuma ao mundo), que anda muitas vezes às turras com os irmãos mais novos, que adora “perder-se” em conversas e brincadeiras com o seu amigo Nicolau, que odeia quando este troça do seu apelido e o associa à canção “Alecrim aos molhos” e que adoraria ter dito ao pai que gostava muito dele, mas que apenas conseguiu ficar plantado, junto à sua cama, a olhar para nenhures. Um menino como outro qualquer. Diferente dos meninos de hoje em dia, diferente do meu filhote, com uma vida e umas prioridades distintas, porém, tão semelhante aos de hoje em dia, na sua inocência, na sua frontalidade, no seu pragmatismo.
Gostei imenso de ler este livro, como gostei imenso de ler outras obras de António Mota. Poderão dizer que são obras datadas, de tempos que já não existem, mas as suas personagens são intemporais, são humanas e, mesmo que sejam crianças que não tenham telemóveis ou tablets como apêndices das suas mãos, são crianças, iguais às deste século ou às de séculos passados. A sua mensagem continua a chegar-nos e a fazer sentido – a mim para quem a lida do campo sempre foi familiar e ao meu filhote que nunca tratou de uma galinha, de uma vaca ou de um cavalo e que nunca soube o que é necessário fazer para regar um campo.
Esta foi a segunda leitura de férias do D. Ambos estamos de acordo que provavelmente será a melhor e que António Mota continuará a ser um autor muito querido para os dois.
Recomendadíssima!

NOTA – 09/10 (a nota reflete a minha opinião)

Sinopse
Plano Nacional de Leitura
Livro recomendado para o 6º ano de escolaridade, destinado a leitura orientada.

Pedro Alecrim reparte os seus dias entre a escola, as brincadeiras com os amigos e o trabalho no campo para ajudar a família. Pedro gosta de andar na escola, embora se interrogue sobre a utilidade de algumas matérias e nem sempre aprecie o feitio de alguns professores. Os dias vão passando, com sonhos, alegrias e tristezas. A morte do pai alterará tudo. Prémio Gulbenkian de Literatura para Crianças e jovens.

Balanço mensal - livros lidos, adquiridos e recebidos em agosto


Em agosto descansei, passeei, relaxei e ainda tive tempo para ler nada mais, nada menos do que sete livros, um número record de leituras este ano. Li em português e em espanhol. Li em formato de papel e em formato digital. Li 4 obras de autores portugueses, uma obra de uma autora italiana, uma obra de uma autora espanhola e partilhei com o filhote a leitura da obra As naus de verde pinho, de Manuel Alegre.
Arranquei o mês com uma estreia dupla. Li pela primeira vez uma obra que me foi facultada pela própria autora – Ana Gil Campos. As impertinências do Cupido proporcionou-me uma leitura divertida, fresca, apropriada à estação veraneia. Gostei do estilo e da escrita da Ana e espero poder ler em breve mais obras suas.
 As obras que li em seguida foram-me igualmente oferecidas, desta vez pela editora. Tão-pouco conhecia as suas autoras, mas as horas que devotei às suas obras resultaram em experiências muito produtivas, especialmente a que correspondeu à leitura de Café Amargo, de Simonetta Hornby, que nos apresenta uma protagonista com um carácter forte, determinado e que, desde que se casa com uma tenríssima idade até alcançar uma idade madura, sempre se regeu por aquilo que a sua razão e acima de tudo o seu coração lhe ditavam. É uma mulher formidável e alimenta uma narrativa muito bem construída e condimentada com um contexto histórico e epocal aliciantes. Já A ilha das quatro estações, de Marta Coelho, é uma obra mais vocacionada para um público juvenil, mas não deixa de nos enredar com as dores e os problemas de quatro jovens nada distintos daqueles que poderemos encontrar no nosso quotidiano.
Em agosto também tive a oportunidade de regressar às leituras partilhadas com o filhote. Lemos num dia a obra em verso de Manuel Alegre – As naus de verde pinho – e foram uns momentos muito saborosos, recheadinhos de cumplicidade e troca de conhecimentos.
O regresso às leituras em espanhol foi pela mão da escritora basca, Marian Izaguirre. Los pasos que nos separan foi a segunda obra que li dela e, apesar de não ter sido uma experiência tão intensa como foi a que me ofereceu A vida quando era nossa, senti uma empatia muito grande com os seus protagonistas e com um tom intimista e emocional que prevalece ao longo da sua narrativa.
A única desilusão deste mês veio de onde menos esperava… Não consegui ligar-me às personagens, às suas personalidades, ao que as movia, às suas atitudes, a nada… Sobrou o estilo e a escrita, tão perfeitos e mágicos. Fico à espera de novos trabalhos de Valter Hugo Mãe, que apaguem este travo amargo que me ficou da leitura de Homens imprudentemente poéticos.
A última leitura do mês ficou a cargo de mais uma autora lusa, de mais uma novidade. O assunto da narrativa de O rapaz e o pombo é talvez aquele que mais persigo, de forma quase psicopata, mas tudo o que leio sobre a Segunda Guerra Mundial nunca me extingue a vontade de saber mais, de tentar entender o que ainda hoje não sou capaz de entender… Gostei muito desta obra, da maneira como Cristina Norton misturou ficção com factos verídicos e me violentou com episódios de horror medonho. A sua trama está obviamente povoada do lado mais miserável do ser humano, mas inclusive nesse lado mais negro há espaço para o amor, para a união, para o altruísmo.

Em agosto, para além de ler, passear, relaxar e descansar, também frequentei livrarias dos dois lados da fronteira e voltei a pecar… Aproveitei uma promoção irresistível e comprei a metade do preço Amores secretos, a única obra de Kate Morton que ainda não habitava a estante cá de casa. Do outro lado da fronteira comprei três obras que estavam na wishlist há muito tempo – Dile a Marie que la quiero, de Jacinto Rey; La delicadeza de David Foenkinos e Cuentos, do meu amado Mario Benedetti. Quatro obras que irão esperar pacientemente a sua vez na prateleira dos não-lidos, mas que sei que, este ano ou o próximo, me proporcionarão momentos únicos de leitura.
Em agosto, para além de ler, passear, relaxar, descansar e pecar “literariamente”, tive o imenso prazer de ser surpreendida pela Cristina Tista, que novamente partilhou comigo mais umas obras em formato e-book. Cuando aparecen los hombres, de Marian Izaguirre, Quien de nosotros, de Mario Benedetti e El secreto de mi marido (O segredo do meu marido), de Liane Moriarty vieram adoçar ainda mais um mês que foi praticamente perfeito e aumentar a estante virtual que vai ganhando espaço na biblioteca do tablet.
Antes de terminar, quero agradecer também à Paula, outra assídua seguidora e que no final de julho me ofereceu, igualmente em formato digital, duas obras que figuravam na minha wishlist há “eternidades” – Charlotte, de David Foenkinos e 84, Charing Cross, de Helene Hanff. Serão sem dúvida leituras muito suculentas e possibilitar-me-ão a oportunidade de voltar a ler em inglês, coisa que já não faço há pelo menos 8 anos.

Como veem, agosto será dificilmente repetível. Leituras, aquisições e ofertas com fartura. Espero que o vosso mês tenha sido igualmente muito apetitoso. Fico à espera dos vossos comentários.

Termino deixando-vos os links para acederem à opinião completa das obras lidas este mês:
§  As impertinências do Cupido, de Ana Gil Campos
§  Café Amargo, de Simonetta Agnello Hornby
§  A ilha das quatro estações, de Marta Coelho
§  As naus de verde pinho, de Manuel Alegre
§  Los pasos que nos separan, de Marian Izaguirre
§  Homens imprudentemente poéticos, de Valter Hugo Mãe
§  O rapaz e o pombo, de Cristina Norton

O rapaz e o pombo, de Cristina Norton


Ficha técnica
TítuloO rapaz e o pombo
Autora – Cristina Norton
Editora – Oficina do Livro
Páginas – 268
Datas de leitura – de 26 a 29 de agosto de 2017

Opinião
O rapaz e o pombo não foi apenas mais uma obra que li acerca das atrocidades cometidas contra os judeus em prol da supremacia da raça ariana. O desconcerto, a dor, o horror, o murro no estômago nunca perdem intensidade, tenha lido um ou dezenas de livros sobre o tema. Continuo a não ser capaz de entender como é que o ser humano pode ser tão desumano com outro apenas porque esse outro professa outra religião, acredita em outros ideais, não segue a mesma orientação sexual ou simplesmente nasceu com outra cor de pele. Continuo a não ser capaz de entender e sinto que a “batalha” que eu e aqueles que também não são capazes de entendê-lo está infelizmente a ser paulatinamente mais difícil de travar, que estamos a perder terreno face ao renascer da barbaridade, da tortura, do controlo, do fanatismo. Perspetiva-se um futuro que vai buscar ao passado o que de pior ele teve.
É por causa dessa perspetiva inqualificável, de tão medonha que é, que urge continuar a vasculhar os hediondos exemplos do passado, partilhá-los com o maior número de pessoas para que a sanidade do mundo em que vivemos não se perca sem volta. Assim, alio o prazer da leitura com a necessidade que tenho de saber, de saber mais sobre tudo o que nos rodeia, sobre quem somos, quem fomos e quem temos que ser como homens e mulheres decentes, respeitadores e que se comportam como seres racionais que somos. Porque o passado e infelizmente o presente em que vivo já nos deram provas mais do que suficientes de que sabemos ser escumalha.
Um dos períodos mais negros e repugnantes da História Mundial foi, sem dúvidas nenhumas, aquele que dizimou milhões e milhões de pessoas apenas porque um ser profundamente maquiavélico e psicopata chegou ao poder de um país humilhado por uma recente derrota e, através de uma ideologia fanática, fez uma lavagem cerebral à maioria da sua população e a levou a crer que o judeu com quem trabalhava, que era o vizinho de uma vida, que o tratava quando estava doente era inferior a um animal, que era a representação do pior dos males e que, como tal, devia ser exterminado. O rapaz dono de um pombo era um desses judeus, um menino filho de um médico respeitadíssimo e de uma enfermeira muito competente, irmão mais novo de uma pré-adolescente com quem andava amiúde às turras e neto de avós carinhosos e dedicados. Um menino igual a tantos, mas de que quase todos se afastam como se estivesse infestado de parasitas desde que determinaram que, mesmo tendo nascido na Alemanha, era o pior dos inimigos da “sua pátria”.
A obra de Cristina Norton retrata a vida da família do rapaz do pombo, as agruras que sofreram na pele como judeus, as tentativas para fugirem à mão assassina dos nazis e o destino que partilharam com milhões de outros judeus e que se adivinha qual foi observando a capa do livro. É uma narrativa que é ocasionalmente interrompida por partes que estão escritas com um tipo de letra diferente e que estão associadas a testemunhos verídicos de duas mulheres nomeadas pelo seu nome próprio e que cujas vidas “tropeçaram” na do rapaz do pombo e familiares mais próximos. Lilo é alemã e amiga da irmã do protagonista que dá título à obra. Rute é judia e foi por breves tempos vizinha da família do rapaz. Ambas, com os seus testemunhos, ajudam a contextualizar os dois lados desta contenda bárbara, a voltar a provar, por um lado, que nem os alemães eram simpatizantes de Hitler e, por outro, a deixar-nos sem fôlego perante um sofrimento e uma dor intraduzíveis e impossíveis de imaginar.
É óbvio que não foi uma leitura fácil. Roí unhas, fechei os olhos, respirei fundo, contive a respiração e chorei. Chorei muito. Mas também é verdade que não podia deixar de fazê-lo, de ler mais uma obra que nos ensina, que nos mostra de forma crua e dura o que se já fez de mais monstruoso e o que não se pode repetir. Ou melhor, continuar a repetir. Os últimos sobreviventes de Auschwitz estão a partir. Mas temos os seus testemunhos. E temos os testemunhos de gente deste século que sobreviveram ou perderam entes queridos nos atentados de Paris, de Barcelona, de Nice, na guerra da Síria, do Afeganistão. A Segunda Guerra Mundial terminou em 1945, mas o Homem não aprendeu. Continua a matar e a torturar. E temo que continuará e que essa matança e tortura não será residual.
Termino por aqui. Necessito ver o sol, o sorriso do meu filho.
Leiam esta obra. Não foi aquela que mais me preencheu sobre o tema. Mas isso é secundário. Conheçam o rapaz do pombo, a sua família (dos quais nunca sabemos o nome), judeus, homens, mulheres e crianças como tantos de nós. Conheçam a sua história, aprendam com ela.

NOTA – 08/10

Sinopse

A história, passada entre os anos 1930 e 1958, gira à volta de três personagens. A principal é um rapaz judeu, que descobre o ódio, o desalento, a ternura e o amor à vida. As personagens à volta dele representam todas as pessoas que passaram por uma das maiores injustiças de todos os tempos. Cristina Norton sentiu também que tinha o dever de escrever e denunciar o que por vergonha as mulheres que haviam sido obrigadas a prostituir-se nos campos de concentração não ousavam contar.